Do discurso das celebridades globais, fica a síntese do mesmo discurso dos políticos que são contra: o Pará não pode ser dividido porque a cultura é a coisa mais importante para se olhar e para se viver. Dividir o Pará seria o extermínio do tacacá e do Mangueirão. O discurso dos do não é tão vazio e vergonhoso como vergonhoso foi o que disse o governador Simão Janete, à equipe do JN, ao afirmar que o problema do Pará não é o abandono é a falta de recursos. Ou seria a falta de competência e de vontade para empregar adequadamente o dinheiro arrecadado pelos cofres estaduais? Segundo dados, se dividido, o Pará, sozinho, continuaria a receber 32 bilhões de reais. Isso prova que, como está, a soma do que recebe chega às cifras de 80 bilhões. Soma de quem não é matemático nem economista como eu. 80 bilhões, para Simão Jatene, é pouco. Talvez sejam pouco mesmo porque milhões são gastos para pagar aos assessores especiais espalhados por aí. Talvez, para Simão Jatene, 80 bilhões não seja dinheiro, como também não são os milhões desviados pelos da ALEPA (Assembleia Legislativa do Pará). Num dos debates que aconteceu dia desses, um dos representantes do não disse que o Pará não quer mais políticos. Ou seja, não quer mais concorrentes para mandar naquilo que já tem dono. A zona de conforto para os que mandam no Pará é boa demais para dividir com os do Oeste e Sul. O osso, mesmo que seja duro, é bom para roer.
O discurso dos do não é vazio. Tão vazio como o choro de Fafá (de Belém), tão vazio quanto o discurso de Dira Paes e de Nilson Chaves, o secretário de cultura do Pará, de Jáder Barbalho e Marinor Brito, a filha desta região que decidiu pelo discurso do não. O discurso dos do não pinta de cinza a realidade que os do Oeste e Sul vivem. Uma realidade marcada pelo abandono, pela falta de saneamento básico, pelas centenas de escolas aos frangalhos, pelo baixo salário dos professores, pela péssima qualidade de ensino (o Pará é um dos estados brasileiros cujo ensino é péssimo) e talvez disso o governador Simão Jatene se orgulhe.
Das poucas vezes que aparece na mídia, o Pará é notícia ruim. Nunca assisti a uma notícia em rede nacional que fale bem do Pará. Sempre há algo a nos envergonhar: é adolescente jogada como animal em cela onde há apenas homens. São trabalhadores mantidos como escravos em fazendas. É o desmatamento galopante (o Pará é o estado que mais desmata, segundo o INPE). É a saúde que vai abismo abaixo. Talvez os do discurso do não queiram manter essa realidade. As lágrimas de Fafá (de Belém) não rolam gratuitamente, se rolam, tem uma mensagem vergonhosa: manter o Pará como está e permitir que a situação de abandono permaneça. O não é o discurso do atraso. É o discurso do poder; poder esse que Pierre Bourdieu assinala como aquele que tenta triturar os outros discursos. O discurso do não celebra o atraso e o abandono em que os do Oeste e Sul vivem. Salvemos o tacacá e o Mangueirão e mantenhamos em abandono os que hoje querem a divisão. É isso que soa no discurso dos do 55.
Embalados por esse falso amor pelo Pará, muitos do Oeste e do Sul abraçaram o mesmo discurso. Esquecem que temos em nossas mãos a chance de mudar a realidade em que vivemos. Temos uma chance única. Temos uma pérola de ouro, mas corremos o risco de perdê-la por puro saudosismo. Esquecemos que, passadas as eleições e, se rejeitada a chapa do SIM, continuaremos a viver a mesma realidade. Continuaremos a depender do Para(zão) que fecha os olhos para os que são vistos pelos de Belém como os “rebeldes”. Esquecemos que seremos sempre olhados como os que não precisam ser assistidos. Abraçar o discurso do não é puro saudosismo. E, se saudosismo mudasse realidade, os românticos teriam mudado a realidade do Brasil na época em que cantavam um amor colorido pelo nacionalismo. Saudosismo não melhora saúde, não melhora qualidade de ensino, não gera emprego nem impede a corrupção. Assim como lágrima não significa verdade. Lágrimas falseiam tanto quanto um sorriso e um discurso trapaceiam.
Temos menos de uma semana para decidirmos o nosso futuro. Temos em nossas mãos a decisão de escolher a mudança ou a permanência. Escolhemos entre salvar o tacacá e o Mangueirão e impedirmos que as lágrimas de Fafá (de Belém) continuem correndo rio abaixo, ou abracemos como oportunidade única a chance de escrever uma nova história para o Oeste e Sul do Pará. Prefiro as armas da mudança a manter o saudosismo sem discurso verdadeiro. O Para(zão), inteiro, só é bonito para ser visto nos mapas, porque olhado por dentro, não representa a grandiosidade que estampa sua territorialidade. O destino de festas, de paz e de amor, cantado no hino do estado, é apenas a ilusão de uma época de sonhos. O Pará não é apenas tacacá e Mangueirão. O Pará é a soma de milhões de pessoas que vivem abandonadas, sem água, sem emprego, sem um túnel que as leve para o futuro. O Pará, de Fafá (de Belém), de Dira Paes e de Marinor Brito é uma ideologia costurada pelo discurso que banaliza a dignidade humana e despreza a inteligência e a vontade do povo.
Como caboclo do Norte, vindo lá da querida Guajará, gosto de tacacá, porém nunca fui ao Mangueirão. Como estudioso da cultura amazônica, eu sei o que representa nossa cultura. Nasci no Pará, mas quero que meus filhos tenham o orgulho de terem nascido em solo tapajoara, ou tapajônico, como se queira chamar. Que dia 11 sejamos todos 77, porque como bem cantou o santareno Ruy Barata “este rio é minha rua...”.
POR JOAQUIM ONÉSIMO.
Joaquim Onésimo - Professor universitário e da rede estadual de ensino, em Santarém. Mestre em Sociedade e Cultura na Amazônia |
Nenhum comentário:
Postar um comentário